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'Cidade Real'

 

Durante os anos 90, o Brasil dedicou-se a resolver sua longa história de inflação e descontrole público das finanças. Conseguiu. Não foi perfeito, nada é, mas o país conquistou a agenda econômica. Os problemas de hoje são sérios, mas esperar o supermercado abrir de manhã cedo, junto com sua mãe, para aproveitar preços melhores, pois seriam remarcados à tarde, é uma história que a geração depois da minha não conhece. Estabilidade gera segurança.

Nos anos 2000, o país dedicou-se à agenda social, e as realizações foram enormes. Outra conquista do país. Milhões foram incluídos na economia, surge uma nova classe social, libera-se o enorme potencial do mercado consumidor interno. Brasileiros se reencontram, viajando de avião; ampliam seus territórios urbanos, comprando carros; conhecem o conforto doméstico, comprando TVs e geladeiras. Consumir gera orgulho.

Estas vitórias não pertencem ao PSDB ou ao PT, à direita ou à esquerda. Estas conquistas pertencem aos brasileiros, realizadas através das suas prioridades e manifestadas através dos seus votos.

Entretanto, o isolamento da classe política em seu simulacro de urbanidade no Planalto Central, deu-se por satisfeita, e ignorou as novas agendas brasileiras.

Não há cidadania plena sem cidade, e a agenda urbana não foi nem proposta nem atacada. O Estatuto da Cidade ainda não disse a que veio depois de 15 anos. Os prefeitos fazem Planos Diretores e basta. Poucas capitais utilizam os instrumentos propostos no estatuto. O Minha Casa Minha Vida é um ópio que cria alucinações de política habitacional. Obrigar imóveis vazios ou subutilizados a ter uso parece loucura de urbanistas.

A população das capitais brasileiras soma mais de 49 milhões de pessoas. A das regiões metropolitanas soma 95 milhões! Todas com os mesmos tipos de problema: centros subutilizados com o patrimônio cultural da nossa civilização em ruínas, ausência de políticas habitacionais, mobilidade desumana, sem saneamento, índices de favelização elevados, péssimos serviços públicos, espaço público em desordem e poucos parques ou praças.

Foi isso que levou estes “consumidores seguros” às ruas em junho de 2013 e proclamaram em alto e bom som que queriam melhores cidades. Mas esse pedido simples virou um grande redemoinho político nos mármores de Brasília, tragando políticos, agendas, pessoas, triturados no moedor de carne da corrupção, e a solução foi o retorno da velha dicotomia da Guerra Fria, entre direita e esquerda.

Ou seja, para o pedido de melhores cidades, ofereceu-se às pessoas mais embate ideológico.

O Rio de Janeiro é oásis nesse deserto de novas agendas. Não por ter sediado a Olimpíada, mas por ter sabido usar bem essa oportunidade, e com muita gestão, oferecer às pessoas um melhor Centro Histórico, melhor mobilidade, melhores serviços, melhores parques, mais patrimônios recuperados. É a única cidade que entendeu a nova agenda urbana que o país precisa encarar.

Curiosamente, observando-se o debate eleitoral, a cidade está pior que antes. Está para quem está preso dentro de ideias preconcebidas, para quem imagina a cidade como espaço doutrinário, para quem não compreende a complexidade urbana como a congestão, sobreposição, e negociação a cada segundo entre inúmeras forças, interesses, vontades, sonhos, desejos. Todos imperfeitos, porém todos válidos.

A maravilha da cidade não é ser de esquerda ou de direita, mas ser tudo e todos ao mesmo tempo. A cidade é das pessoas e é das empresas. Assim foi há seis mil anos atrás, assim será no futuro, e atenção com quem oferece um plano sem cacofonia composto por uma nota utópica harmônica. É falso por estar desprovido de humanidade. Parece jovem, mas é velho. E cidades espelham o nosso esforço de melhor união.

Logo, para melhorar a cidade, é necessário mover-se com todos, para todos, usando o melhor da inteligência pública e o melhor da inteligência privada, através da governança, da gestão, de entregar, de realizar, pois também é assim que procuramos mover nossas vidas na busca pela felicidade.

A política não é maior que a vida. Não se trata de apenas ser, mas como ser, como fazer, como implementar.

Prefeitos doutrinários levam cidades ao caos e prefeitos humanamente imperfeitos, porém movidos por vontade, podem mudar a cidade para melhor.

Eduardo Paes e seu compromisso cotidiano com a cidade melhoraram o Rio. Soube transformar o dia a dia em execução, em priorizar união, em lidar com a imperfeição, superando-a com trabalho, implementando, fazendo utopia ao caminhar. E assim entregou o que a cidade buscava há mais de 50 anos.

 

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